Columbia Road – Seguindo as flores
Durante a minha infância no “bairro carioca mais lindo do mundo”, o Humaitá, a senhora minha mãe, Dona Toninha, tinha o hábito de passar todos os dias pelas bancas de flores. Eu não entendia o que tinha de tão especial naquela sina diária e entre tantas coisas que minha mãe me ensinou na vida, ela também me ensinou a sentir o aroma das flores.
Uma flor é o carinho do saudoso que o distante não consegue nem ver. É o suspiro verdadeiro do boêmio que a puta não consegue entender. É o palco que acham que é cenário.
É como conversar de madrugada aos pés de uma “dama da noite”, – não se faz isso pelo papo, nem pela noite, mas sim pelo aroma. É como ver um quadro do Von Gogh, – não pela técnica, nem pelo museu, mas por saber que até um cara que cortou as próprias orelhas se rendeu diante de um girassol. É como caminhar em um sábado de tarde na Columbia Road, a rua das flores aqui de Londres, – onde as pessoas não são cheias de vida por si só, elas sentem, de forma inconsciente, ou não, involuntária, ou não, a necessidade de dar um pouquinho de luz para tanta harmonia. Ontem, por exemplo, dia em que a cidade amanheceu um pouco menos fria, com raios de sol e céu azul, tenho certeza que foi porque o próprio inverno resolveu, mesmo que por alguns instantes, assim como eu, admirar a rua de flores mais tradicional da terra da rainha. Esse tal inverno que se acostumou com a Columbia Road cheia de cores e aromas desde 1886 e também ficou chateado com alguns momentos de desaparecimento, como por exemplo, na época da Segunda Grande Guerra.
Pessoas levando arranjos e pinheiros de natal, de certa forma queriam pegar um pouquinho de tanta vida e levar consigo. Alguns até tomavam café nas tantas cafeterias ao redor, talvez para enganarem o olfato e depois de uma xícara amarga conseguirem sentir novamente o primeiro impacto da essência das margaridas. Mesmo com as atividades em Columbia estarem programadas para acabar às 14 horas, as pessoas pareciam não aceitar. Insistiam em perambular pelas flores durante o maior tempo possível, e assim foi, até às 16 horas. Quando as barracas se cansaram. Em menos de 30 minutos sem o mercado de flores, o tal inverno resolveu voltar para as atividades rotineiras. O dia escureceu antes das 17, a chuva caiu. Londres voltara a ser cinza.
Hoje, depois de ter passado um dia em Columbia Road, entendo: Dona Toninha não compra flores pra encher o lar de vida. Ela traz vida pra chamar a casa de lar.
Comentários