O restaurante mais antigo do mundo
Paulinho da Viola em seu documentário Meu Tempo é Hoje (2003), explica este título falando que “Eu não vivo no passado. O passado vive em mim”. Sem dúvidas essa é uma frase não só impactante, mas que nos possibilita uma ampla reflexão sobre a subjetividade do tempo. O raciocínio que Paulinho sugere é que quando, por exemplo, uma pessoa vê uma obra de arte, não importa qual é a data dessa obra, o que realmente interessa é se ela está “viva” ou “morta” dentro de quem a vê e é aí que essa lógica se torna vital para muitas experiências da vida fazerem sentido. O passado vive dentro do sujeito.
Essa “vida atemporal” pode, inclusive, nos matar. Como uma paixão ou uma crença que já morreu para o mundo e insiste em viver em nosso peito. Porém também pode intensificar o nosso viver e é assim que eu vejo vida, por exemplo, na voz do Sinatra em um vinil e também em alguns lugares. Foi assim quando escrevi neste site sobre o Gordon`s Wine Bar e é assim agora, que escrevo sobre o Sobrino de Botin.
A verdade é que relatos sobre restaurantes nunca foram os meus preferidos. Geralmente a maior curiosidade que um chef pode te proporcionar só pode ser absorvida pelo paladar, jamais por um texto. Mas neste caso estamos falando sobre a casa que, segundo o Guinness Book, o livro dos recordes, é “o restaurante mais antigo ainda em funcionamento”, ou seja, até existem restaurantes mais antigos, mas “sem parar”, funcionando todos os dias desde 1725, só o Botin mesmo!
Na verdade a construção do local desse restaurante foi feita em 1590, no coração da cidade de Madrid, perto da Plaza del Sol. Há fortes boatos que em 1765, quando o restaurante tinha “apenas” 40 anos, o jovem Goya, então com 19 anos, foi o lavador de pratos da casa antes de se tornar um dos maiores pintores da história. E sabe que nesse final de semana, quando estive lá no Sobrino de Botin, por alguns instantes me senti no século XVIII. Senti isso logo quando cruzei suas portas de madeira e esperei uma mesa desocupar. Enquanto isso espiava a cozinha cheia de leitões prontos para entrar em um forno à lenha de séculos. Tudo aquilo era muito intenso, naquele momento minha casca estava em 2013, mas meu ser interno estava alguns séculos atrás, talvez lavando louça com o Goya.
Os garçons, que talvez também tenham alguns séculos (rs), logo me acomodaram numa mesa e, mesmo não sendo muito fã de carne de porco e principalmente, do sadismo de ver o bichinho assado por inteiro, fiz questão de pedir a especialidade da casa, o Cochinillo Assado. Como já disse anteriormente, detesto descrever algo que só o paladar pode absorver, mas posso dizer que as iguarias que saem do forno a lenha do Botin são as grandes responsáveis pelo sucesso de séculos da casa. Esse lugar que não vive no passado, o passado é que vive nele.
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