Matadero de Madrid
Há pouco mais de um século, em 1911, foi construído o maior e principal matadouro de Madrid, no sul da cidade. Não muito tempo depois, já na década de 30, quando o obcecado em touradas Ernest Hemingway vivia em Madrid, ele fez desse matadouro um de seus lugares favoritos. Ele disse ao seu amigo e também biógrafo Aaron Hotchner que frequentemente acordava de madrugada e ia até lá para ver os novilleros e até o próprio matadouro. Dizia que era prazeroso.
O cenário que Hemingway estava acostumado a visitar ficou em uso até 1996, e com a
virada do século a Prefeitura de Madrid decidiu reformar e transformar aqueles imensos galpões em algo muito diferente de matar animais. Hoje, o Matadero se intitula um centro de criação contemporânea. Para mim lá parece um pouco o SESC Pompéia, em São Paulo, porém muito (muito) maior. Com mais de dez galpões (que eles chamam de nave), eu senti que estava dentro de uma “caixa de surpresas”, pois a cada nave que eu entrava me deparava com uma coisa deliciosamente diferente: ou uma lanchonete incrível, ou um cineminha do bom (pena que lá o filme é dublado), uma exposição, um espaço de música… Há uma nave, por exemplo, chamada “Casa do Leitor”, que como sugere é dedicada ao mundo dos livros – com cursos, conferências e exposições que se relacionam a esse universo. A maior exposição dessa nave, no momento, se chama “El Hilo de Ariadna”, que enfatiza a importância da leitura através de associações com labirintos. “Ler é penetrar e revelar o labirinto. O labirinto da informação, claro, mas ainda mais: o próprio labirinto da vida, tantas vezes aberto e fechado. Atrativo e temível. Vencível e infranqueável”.
Bem no centro do Matadero há uma praça enorme – rodeada pela arquitetura dos bonitos golpões – que estava vazia devido à chuva, mas que imaginei ser um lugar muito vivo, cheio de pessoas nos finais de semana de sol. Porém junto à mim e à chuva também havia na praça retratos do espanhol Jorge Fuembuena, que fez um jogo de imagens bem legais com a frente do corpo, onde fica o rosto, e atrás, onde fica a nuca – que também não deixa de ser um retrato.
Essa imensidão que o espaço é por fora também reflete no seu interior. As naves, além de serem enormes, são organizadas com poucas mobílias, ampliando ainda mais o lugar. Cadeiras confortáveis pelos salões, exposições, livros… dá para se sentir em casa, quer dizer, no meu caso temporário aqui na Espanha, dá pra se sentir até melhor que em casa!
O Matadero mostra assim, mais uma vez, como no caso de La Tabacalera que comentei aqui, que a melhor maneira de se aproveitar um espaço como esse é dando a ele um novo sentido. Pois espaços não são como a vida, ou a leitura – eles não se perdem em um labirinto. Podemos, pelo menos mais seguramente, escolher seu destino.
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