A Feira de São Cristóvão
Para ouvir lendo:
http://www.youtube.com/watch?feature=player_detailpage&v=djKItmfsslc
A Feira de São Cristóvão é simplesmente um daqueles programas divisores de águas. E se você gosta de uma mistura cultural, a sua primeira vez provavelmente não será a única.
Para minha vergonha pessoal, até julho deste ano eu ainda não havia ido a famosa Feira de São Cristóvão. A oportunidade aconteceu em um sábado, logo após chegar na Pedra do Sal para uma noite de jazz e encontrar um baile charme* bem vazio. Uma amiga sugeriu partirmos para a Feira, e como já estávamos relativamente perto, resolvemos ir. No caminho percebemos a coincidência, era dia de São Pedro, a grande data comemorativa das festas juninas. Dizem por aí que apesar de Santo Antônio ser o santo casamenteiro, é no dia de São Pedro que se escolhe o melhor pretendente. Então eu já sabia o que esperar, uma grande festa junina, cachaça, karaokê, carne de sol e clima de paquera no ar.
A primeira impressão que se tem logo na entrada, é que chegamos a Disneylândia do Nordeste. Só que com a vantagem de a entrada custar R$3. Antes de cruzarmos o portão, surpresa! Um grande banner nos avisava de um concurso que aconteceria ali em breve, “Concurso a mais bela gordinha do Brasil”, com música tema e tudo, ‘Coisa Bonita’ do Roberto Carlos – adequado -. A Feira de São Cristóvão já tinha o meu coração antes do portão de entrada.
Entre o portão principal e a catraca da entrada, brinquedos de parque como carrossel, pula-pula, barraquinhas de tiro ao alvo, pipoca e argolas. Uma festa junina legítima, com tudo que tem direito.
A Feira é um espaço criado e frequentado por migrantes nordestinos interessados em compartilhar a saudade da música, das artes e da comida do nordeste, e lá se encontra de tudo um pouco. Roupas, sapatos de couro – alguns bem fashion e pela bagatela de R$30 -, cabine de foto 3D com acessórios nordestinos, a lá Lampião e Maria Bonita, estilingues – apropriados para momentos de manifestação -, pênis e vaginas de madeira – cuja utilidade preferi não compreender -, e vários outros artigos de artesanato.
Havia inclusive uma lojinha especializada em literatura de cordel, um gênero literário popular escrito de forma rimada e cadenciada, originado em relatos orais e depois impresso em folhetos. Os títulos eram uma maravilha, “Encontro de Lampião com Adão no Paraíso” e “O filho de Juvenal e a Serpente de Fogo”, para citar alguns. Um arrependimento: Não ter levado um exemplar como recordação.
Depois de alguns minutos andando entre as lojinhas, cheguei ao belíssimo palco principal, onde rolava um autêntico forró nordestino. Um grande cartaz do Conhaque Alcatrão, ” O conhaque do milagre” me lembrou que aquele era o momento de pegar uma bebida. E logo ao lado esquerdo do palco achei uma barraquinha de bebidas bem pitoresca.
Acho que eu não bebia uma Caipifruta, daquelas com bastante leite condensado, desde a minha adolescência no carnaval de Arraial do Cabo. De quebra a barraquinha ainda vendia o clássico drink “Pau da Coxa”, despretensiosamente escrito como ‘Cocha’, e também o Capeta, outro clássico do carnaval da Região dos Lagos. Opções (com leite condensado e cachaça) não faltavam.
Para acompanhar a bebida, salsichão, tapioca, diversos tipos de carne e diversos outros pratos regionais. Era só escolher. Até provei o guaraná Jesus, fabricado e distribuído no Maranhão. Mas infelizmente o design bacana de sua embalagem não correspondia ao sabor do refrigerante, muito bem descrito por uma amiga, como “refrigerante de Bubbaloo de tutti frutti com guaraná, só que ruim”. Pelo menos valeu a foto.
Um dos protagonistas da Feira são os diversos karaokês espalhados pelo pavilhão. Um ótimo momento para descobrir que por algum motivo oculto várias letras sertanejas estão decoradas em algum lugar do seu inconsciente. E aí é só deixar fluir. A desenvoltura do público é convidativa e a vergonha de desafinar fica na porta da entrada.
A pergunta final que me fiz, foi por que esperei tanto tempo para ir conhecer a magia nordestina no Rio de Janeiro. Uma visita não cobriu nem metade dos encantos daquele lugar, que não à toa está em processo de reconhecimento como patrimônio cultural imaterial do Brasil pelo IPHAN. Vale voltar mais uma, mais duas e mais muitas vezes.
* Charme é tipo um funk americano com soul, só que dos anos 80 e 90.
Fotos por Fernanda Sigilião
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