Cine Monstro
Sempre gostei do efeito surpresa. De ver um filme sem ter visto o trailer, de comprar um livro, tendo lido apenas o prefácio, e de me deixar aberta ao novo, com o mínimo de expectativas possíveis. E foi nutrindo essa deliciosa curiosidade que fui levada a ver Cine Monstro.
A peça, em cartaz no Oi Futuro Flamengo, foi, para mim, uma das melhores surpresas artísticas dos últimos tempos. Ela é um envolvente enigma, que entrelaça a estória de 13 personagens em um poderoso monólogo. Estruturada com uma pegada meio David Lynch, de dinâmica narrativa não linear, a peça com texto de Daniel MacIvor, premiado autor canadense, é dirigida e também encenada por Enrique Diaz, que a conduz em um desempenho excepcional, tão íntimo do palco e do texto.
A trama navega entre o perverso e o poético ao revelar o lado obscuro, o voyeurismo, o medo e o ego que conectam as estórias em cena, e que por sua vez, se conectam com nossas próprias estórias pessoais.
Envolvida, diante dos momentos de maior tensão, eu precisava me lembrar de respirar. A atmosfera misteriosa e a cronologia aleatória me mantinham absorta na narrativa, atenta a todos os detalhes. Mas isso não significa que a peça também não tenha um pouco de humor, algumas cenas despertam o riso da plateia, que também tem um papel de interação com a trama. A plateia participa, ela também é personagem. Mas de uma forma diferente.
Muitas críticas sobre a peça definem seu tema com mais detalhes e interpretam seus significados, mas para mim, uma das delícias desse espetáculo é justamente a multiplicidade de significados. A peça estimula a identificação do espectador, e isso é tão pessoal que as interpretações podem ser diversas. Característica em falta nos dias de hoje, onde todos os significados são entregues de bandeja, deixando pouco para a imaginação da audiência.
A peça também explora com desenvoltura a interseção entre recursos audiovisuais diversos, integrando teatro, performance, cinema e artes plásticas, fato que ajuda a criar uma estória multifacetada e a conduzir o espectador para dentro da narrativa.
As projeções visuais são exibidas em três grandes platôs, e as imagens criadas por Batman Zavareze e Nathalie Melot, sensoriais e minimalistas, constroem o cenário físico e emocional de cada personagem. Essa convergência de recursos, só faz enriquecer o enredo, tão expressivo em casa passo.
“Eu sou a sua raiva e a sua frustração. Eu sou seu tédio e sua angústia”. Cine Monstro é uma peça sobre todos nós. Ninguém é apenas luz e ninguém é apenas sombra, em algum momento você vai se identificar.
Cine Monstro de quinta a domingo, 20h até 28/07, no Oi Futuro.
Foto 1: Divulgação/ Festival de Curitiba // Foto 2: Divulgação/ Annelize Tozetto // Foto 3: Divulgação Facebook // Foto 4: Divulgação/ Nathalie Melot
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