Editores independentes e a Feira Plana
Já eram duas da tarde do sagrado sabadão. Acordei com o sol subindo no meu colchão e queimando o meu pé. Meu vício digital fez eu pegar o celular simultaneamente com o abrir dos olhos. Minha primeira visão do dia foi a cabeleira da namorada, e a segunda, a tela do meu Iphone ostentando a mensagem: “agenda: Feira Plana 2″.
De fato, era tudo o que eu precisava. Se alguém me perguntasse “o que é a felicidade?”, eu responderia: acordar tarde no sábado, ir com minha morena na padaria, comer um pão na chapa e um suco de laranja enquanto papeio com o chapeiro Manoel e depois, finalmente, passear no MIS (Museu da Imagem e do Som de São Paulo) de mãos dadas para prestigiar a Feira Plana 2, uma feira de publicações independentes que rolou no sábado e no domingo deste último fim de semana.
A Feira Plana se intitula como um lugar de “publicações independentes, fictícias, guerrilheiras e zines”. Vivemos em tempos em que a liberdade editorial vale ouro, e é um barato poder escrever o que se pensa – sem censuras. Se aqui pela internet isso já é um tesão, imagina escrever e depois ver tudo aquilo impresso no papel. Pelo menos foi esse o insight que o Paulo Silva Júnior, idealizador do jornal OcicerO, me proporcionou. “O tesão principal é escrever em um jornal. Claro, tem o custo da gráfica, mas o que destaca é o tesão da galera em fazer a coisa impressa. Passamos a faculdade toda com professores falando no nosso ouvido que o jornal impresso ia acabar, e a gente: ‘não, vamos fazer impresso’!”. O jornal, que hoje conta com 32 colaboradores, já está em sua terceira edição, sendo que cada uma delas aborda um diferente tema. A primeira falou sobre o centro, a segunda sobre bebida e a atual discute sobre o verão.
Além dos livros e diversas outras publicações que estavam sendo vendidos ali, me apeguei ao clima que rolava naquele sábado ensolarado na “varanda” do MIS. Inúmeros e estilosos frequentadores tomavam suas cervejinhas enquanto prestigiavam obras que veio das mais diversas partes do Brasil. Era um ambiente interessantíssimo, com inúmeros sotaques. Alguns bem conhecidos, como o dos belo-horizontinos “gente boa” (mineiro gente boa = pleonasmo) da Galeria Quartoamado e o inconfundível sotaque carioca que vinha do estande da editora A Bolha. As publicações expostas dos mineiros do Quartoamado foram focadas em artistas locais, já a editora carioca trouxe para a feira obras do mundo inteiro. Vieram livros de Moçambique, da Finlândia, da França, e uma história em quadrinho muito interessante do cartunista canadense Seth, a Wimbledon Green – que não pude deixar de comprar, é claro.
Senti que em absolutamente todos os papos que tive por lá, a mensagem que ficou nas entrelinhas foi: “o mercado brasileiro é desenvolvido para detonar a gente. Nenhuma grande editora quer que exista uma feira como a Plana”.
E o pior é que consumimos os impressos mainstream desde sempre. Por isso achei muito legal conversar com a Liana, fundadora da Yoyo, uma revista independente para crianças. Um dos motivos que a fez criar a revista foi ver sua filha pequena vendo nas bancas de jornal apenas revistas que ela julgava não serem ideais para a formação de sua pequenina garotinha (e cá pra nós, ninguém quer que o filho vire um “Patatonto”). Achei muito bacana esse lance da revista respeitar a inteligência das crianças.
Posso dizer que foi uma tarde em que fiquei maravilhado com o mundo das editoras independentes. Tanto que a feira estava bombando – com show e workshops –, mas o que eu estava curtindo mesmo era conversar com os editores (e dá-lhe namorada do lado comprando livros).
No final da minha “voltinha” pelo MIS eu ainda tive um papo que foi a “cereja do bolo”. Conversei com a dona Maria, uma das trabalhadoras do Dulcinéia Catadora – um coletivo que vem do trabalho de catadoras que confeccionam livros com capas de papelão. Não é incrível? Pô, a dona Maria faz e vende seus livros brincando e as grandes editoras vem querer me empurrar só o que elas querem publicar?
Foi no meio do papo com a dona Maria que, mais uma vez, a tela do celular indicou um outro compromisso. Tinha que ir embora da Feira Plana. Percebi estar sem dinheiro para o taxi, porque, de certa forma, é justo editoras independentes não aceitarem, em alguns casos, cartões de crédito, apenas “dinheiro vivo independente”. Mas quem se importa?! Afinal de contas, foi um dia de felicidade!
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