Música instrumental e improviso em Botafogo
Todo mundo tem um lugar favorito, uma extensão da própria casa ou um pedacinho inspirador da cidade para chamar de seu. Manoel Carlos tem o Leblon, Noel Rosa apresentou o feitiço da Vila Isabel para o mundo e Roberto Carlos troca de nome, mas não troca a Urca. Já eu, tenho um amor profundo por Botafogo. O bairro tem se confirmado como um verdadeiro epicentro cultural, e acho que ele representa bem a pluralidade artística que se pode encontrar no Rio de Janeiro. Onde apenas vinte passos separam o rock n’ roll mais alternativo e avant-garde da cidade, do pandeiro jazz inventivo de um músico meio brasileiro, meio americano.
Na última semana, e na mesma quinta-feira, aconteceram dois eventos curiosos, o
Quintavant na Audio Rebel, a casa/estúdio mais underground do bairro, e a primeira
edição do Jam Rio, no Oztel, um charmoso hotel boutique. Dois eventos completamente diferentes, mas com a mesma proposta de trazer novidades para a cena cultural carioca, apresentando música instrumental.
O Quintavant é um evento dedicado ao improviso coletivo e à experimentação. A ideia é inspirada em casas como The Stone (NY) e Café Oto (Londres), lugares que se definem como o espaço dos novos artistas, onde o foco é destacar o cenário musical que acontece fora do que é considerado mainstream.
A última edição recebeu a apresentação do guitarrista e engenheiro de som canadense Eric Quach, do thisquietarmy, e os cariocas Dedo e Bemônio. Em uma noite de noise/drone e shoegaze, estilos que pouco aparecem na cena musical carioca, o thisquietarmy fez um som hipnótico e minimalista, conduzindo o público a um transe durante todo o show.
http://vimeo.com/68055050
A pegada do thisquietarmy reúne guitarra, muitos pedais de efeito e loops registrados ao vivo durante a apresentação, reproduzidos na sequência durante as músicas. Além do altíssimo volume e da repetição de sons, a distinção desse estilo musical está também nos múltiplos estímulos que ele provoca. É impossível se envolver apenas com a audição, o grave das caixas de som e os ritmos previamente gravados, parecem despertar o corpo inteiro com suas batidas.
Há alguns passos da casa mais rock n’ roll do bairro, acontecia a primeira edição do Jam Rio, no Oztel. Um hostel super estiloso, com um belíssimo jardim suspenso e uma fachada colorida do Coletivo Muda.
Lá se apresentava o músico Scott Feiner, americano que há 12 anos no Brasil, não só conhece os ritmos brasileiros como também improvisa e cria uma mistura de jazz com a cadência do pandeiro.
A ideia de valorizar a música instrumental, fugindo do lugar comum das casas noturnas, surgiu entre as amigas Marcella Linhares, Mariana Mattos e Lili Araújo, que convidam artistas de diferentes backgrounds para apresentarem seu trabalho autoral. “Temos ótimos artistas despontando e outros que já atuam há algum tempo. Acredito que faltem espaços que acolham esses artistas e seus trabalhos, principalmente em relação a música instrumental”, diz Marcella. Por isso, o Jam Rio, que a princípio terá três meses e irá acontecer quinzenalmente, tem tudo para ficar além do inverno.
Independente do estilo ou do público, eventos como esses tem autenticidade e apontam os holofotes para o que é moderno e atual. Por isso, cuidado ao afirmar que o Rio vai do funk ao samba, a cidade já provou ser muito mais eclética e internacional do que se imagina. Basta saber onde procurar.
Fotos por Fernanda Sigilião
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