Arte e noite na antiga igreja
Foi cantarolando “Trem das 7”, do Raul Seixas, que fui até Toledo, uma cidade que fica cerca de 70 quilômetros da capital espanhola. É uma parada agradabilíssima para quem procura respirar história e ar puro – e como vivo em tempos de absorver muita informação e uma infinidade de descobertas, passar um final de semana em uma cidade pequena para dar um relax me pareceu uma ideia bem boa.
Parti da estação Atocha Renfe na sexta-feira de noitinha com uma mochila nas costas, um bom livro na mão e muita animação para “Toledar”. Acabei me deparando com um dos lugares mais incríveis que conheci até então. Toledo é milenar, uma cidade medieval cercada por um rio com ruas de pedra bem estreitas. Em seu centro há uma catedral belíssima, museus, muitos artefatos de aço para vender, – principalmente armaduras e espadas medievais – e era exatamente a paz que eu procurava. Já no sábado passei o dia lendo e fotografando em lugares absolutamente calmos e quando voltei ao meu albergue senti algo que não sentia desde quando tinha chegado à Espanha – estava com “as minhas baterias recarregadas”. E foi aí que o dono do hostel me indicou o Círculo de Arte de Toledo.
O Círculo de Arte fica em um lugar onde era uma igreja e hoje é usada como “arena multi-uso” – espaço onde tem exposições, teatro, música, aulas de dança, enfim, manifestações artísticas de uma forma geral. Como estamos falando de um sábado à noite, o Círculo estava funcionando como uma balada mesmo, a balada quente da cidade. Começava a ficar boa às duas da matina, ia até às 7… Fiquei animado né! Pô, em uma cidade milenar, onde as construções são muito mais velhas que o descobrimento do Brasil, em um espaço que era uma igreja, em teoria são todos os ingredientes para uma noite perfeita! Chamei a namorada e falei “vamo que vamo”. Fomos.
Ao chegar concluímos que, de fato, é um lugar formidável, onde a “carinha” de igreja medieval é ditada pela espessura de suas paredes de pedra, sua sustentação por arcos ogivais, pé-direito alto, portas em madeira espessas e antiquíssimas. Na parte interna “gente bonita e sorridente”, um serviço de bar competente, porém nessa noite ouvi uma música lamentável. Nada, NADA justifica uma curadoria musical tão ruim. Falo sem medo de errar que a música do “tche,tche re rê Gustavo Lima e você” foi o que tocou de musicalmente mais refinado na noite. Infelizmente, e digo infelizmente mesmo, a música conseguiu estragar um espaço que tem magia suficiente para se ter uma noite inesquecível.
No dia seguinte, lendo meu livro, parei e pensei sobre a forma que pessoas e lugares maravilhosos são facilmente destruídos, e tantas vezes seus destruidores nem fazem por maldade, muito pelo contrário. Esperei o trem das 7 cantarolando a música do Raul que tem o mesmo nome. Um dia voltarei para Toledo, voltarei para o Círculo de Arte e terei uma noite ainda mais maravilhosa, afinal de contas, as ondas sonoras se esvaem enquanto os muros de Toledo ainda estarão resistindo ao tempo por mais alguns milênios.
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